Last Updated on: 15th maio 2021, 07:12 pm

Sabe aquelas casas em que a decoração parece ter surgido da forma mais espontânea possível? Assim é o lar da artista e designer de estampas Clarisse, que descobriu uma verdadeira pérola na Lapa: uma casinha charmosa, com espaços amplos e acabamentos rústicos lembrando as construções do interior. Tem cimento queimado, tem ladrilhos hidráulicos, tem janelas com venezianas brancas e porta colorida… uma combinação pra lá de acolhedora, ainda mais se levarmos em conta os móveis antigos e os objetos queridos da moradora. “Estou sempre mudando as coisas de lugar, conforme as necessidades ou meu estado de espírito. Os vasos são os que mais transitam pelos ambientes, e a cada semana testo uma planta em um novo local”, ela conta.

A cozinha de Clarisse não é muito grande, mas também tem suas surpresas. Segundo ela, o espaço é uma extensão da sala, com plantas, quadros e até trechos de papel de parede na geladeira. A pintura rosa foi uma invenção da artista, que queria fazer uma referência às casas nordestinas. “Tenho uma paixão pelas paredes caiadas do sertão, e o rosa é uma cor presente por lá. Não ficou exatamente como eu gostaria porque fui aconselhada a não usar cal em ambiente interno, muito menos na cozinha, mas devia ter sido mais cabeça-dura”, diz. A janela de ferro sobre a pia é um dos detalhes que Clarisse mais gosta na casa, e ela brinca que a luz da manhã é tão linda que até dá vontade de ficar horas lavando a louça.

O quarto é um verdadeiro ninho, um lugar onde o aconchego físico e o emocional têm o mesmo valor, e a decoração é um reflexo disso, portanto repleta de afetos. A estante suspensa ao lado da cama, por exemplo, foi criada por Clarisse com a ajuda do faz-tudo da vila e serve de apoio para livros e memórias. “Afetivamente falando, cada detalhe do quarto é bem especial, mas eu amo o lambe-lambe sobre a cama, com a foto do Gui, um amigo querido. Recriei meu horizonte preferido e através dele passo um bom tempo da vida observando o mar”, ela fala.

O ateliê oficial de Clarisse é em outro endereço, mas ela instalou um segundo espaço de criação no mezanino da casa, que fica sobre a área da cozinha e conecta-se tanto com a sala quanto com o quarto. O que ela mais queria era sentar na mesa de trabalho olhando para o jardim, então a disposição dos móveis girou em torno disso. A moradora trabalha com estamparia há quase 10 anos e encara essa arte como uma alternativa de linguagem, algo que a leva constantemente a novos lugares, encontros, vivências e entendimentos.

“Foi o caminho que encontrei para dar continuidade a uma pesquisa autoral, sendo o Veredas Atelier meu laboratório experimental onde crio com total liberdade. Paralelamente, mas com a mesma preocupação linguística, desenvolvo estampas para designers e marcas do setor da moda e decoração. O legal é que a estamparia pode ser explorada em infinitos suportes: ladrilhos hidráulicos; tecidos para decoração; roupas… a estampa precisa ser usada pelo outro para se tornar viva, e isso me encanta. Ninguém escolhe forrar um piso inteiro ou um sofá com um desenho que não lhe faça sentido e, apesar da estampa passar a ter novos significados quando usada pelo outro, ela também carrega consigo uma história própria – e é aí que entra minha pesquisa sobre a estamparia como possibilidade de comunicação”, Clarisse explica.

Ao lembrar da casa em que passou a infância, Clarisse consegue enxergar algumas referências similares em seu novo lar, sendo que boa parte dessa linguagem própria foi inspirada por seu pai.  “Ele é artista plástico, acumulador, maravilhosamente louco sem juízo. E minha mãe é alemã, com um estilo menos é mais, e critérios absolutamente funcionais: era casa engraçada com decoração peculiar. Certamente puxei de meu pai o vício por plantas, ferros-velhos, sebos, antiquários e tranqueiras. Não posso ver uma caçamba cheia que meu coração já bate forte”.

Fotos por Isadora Fabian, do Registro de Dia a Dia