Last Updated on: 12th maio 2021, 06:33 pm

Muitas pessoas sonham em trocar seu apartamento por uma casinha de vila, mas com Joana, da Manacá Arquitetura,aconteceu justamente o contrário. Após um tempo vivendo em uma casa charmosa, porém escura e compartimentada, ela decidiu testar a experiência de morar em um apê, então buscou um espaço amplo que pudesse ter as funções mais integradas. “Queria experimentar os diferentes ‘morares’ de uma cidade como São Paulo. Sou arquiteta, e uma das áreas de meu trabalho é reformar apartamentos. Sempre morei em casas, e a vivência de me adaptar à vida de apê está sendo muito enriquecedora”, ela conta.

Mas não pensem que por isso a moradora quis fazer uma decoração urbana ou industrial. Na verdade, ela procurou trazer um clima aconchegante de casa para o apartamento alugado – e conseguiu. A rede de balanço no meio da sala, os móveis de madeira e os acabamentos rústicos ajudam a trazer essa sensação. Além disso, o prédio baixinho com apenas 3 andares e janelas na altura das árvores às vezes a faz esquecer de que vive em uma grande metrópole.

Antes de se mudar, no início de 2018, a arquiteta precisou fazer algumas alterações no imóvel, em especial na área de jantar. O antigo proprietário tinha dois apartamentos unidos no mesmo andar, então só havia uma cozinha oficial. Quando o imóvel foi dividido novamente, a cozinha ficou com o vizinho e foi feita uma copa provisória na área de serviço de Joana. Então inevitavelmente seria necessário recriar a cozinha original. “Foi quando eu desenvolvi o novo projeto para um ambiente amplo, agregador e integrado à sala. Adoro cozinhar, receber amigos, e quanto mais pessoas, melhor”, ela diz. Após o quebra-quebra, o pilar que não pôde ser removido ganhou uma pintura feita especialmente para Joana pelo proprietário, que é publicitário e artista plástico.

Além dessa reforma, a moradora também instalou luminárias novas em alguns pontos do apartamento, incluindo a sala. O modelo com trilhos expostos foi inventado por ela com a ajuda de amigos – um trabalho tipo mutirão com diversas pessoas para construir a peça. “Aqui é uma casa cheia de amigos que fazem parte da história”, fala. Outra mudança importante foi a criação da bancada de trabalho, já que Joana não queria ter um escritório isolado. “Na casa antiga, o home office era em um quarto, mas quartos para mim servem para dormir. O que mais valorizo era estar nos espaços sociais. O lugar de estudo, reuniões e encontros sempre foi na sala e em nosso trabalho procuramos projetar ambientes que reforcem a convivência. Então acho que acabou ficando coerente nosso escritório estar integrado com o restante”, explica.

Joana diz que trabalhar em casa tem seus prós e contras, porém a flexibilidade de horários vale qualquer esforço. Para ela, que tem duas cachorras e viaja bastante, faz toda diferença poder sair para passear com as mascotes durante a tarde ou simplesmente levar o computador para a casa de sua família em Ilhabela e trabalhar por lá. Fora que assim ela pode reduzir custos por não precisar arcar com aluguel e contas de um espaço comercial.

A decoração do apartamento tem muita brasilidade. Não só pela rede de balanço ou pelas plantas que ocupam a sala, mas também pelos itens de artesanato popular, a mesa de jantar com ar caipira e as obras de arte que a moradora tanto ama. São peças escolhidas mais pelo sentimento do que pela necessidade de combinarem entre si: a rede remete à sua vida em Ilhabela, ou às sonecas que seu pai sempre tira quando a visita; o quadro na cozinha, pintado pela sócia Kris, é uma porta encontrada em uma caçamba; a cabeceira da cama do quarto de hóspedes era de seu berço e foi desenhada por seu pai e por aí vai.

Joana acredita que existem diversas maneiras de tornar um espaço acolhedor, alegre, receptivo e vivo – um verdadeiro lar. “Precisamos ter lugares e móveis que atraiam a permanência das pessoas, pois é assim que a vida acontece na casa, com a troca de conhecimentos e energias…”, fala. Por isso ela fez questão de usar peças que trazem cor e alegria, além dessa sensação de receptividade. “Este cuidado com cada detalhe, e principalmente com a vida dos seres que ali habitam, como as plantas e os animas de estimação, transformam a casa em um lar, e dessa maneira você se sente mais vivo do que nunca”, completa. E essa mudança realmente marca um novo ciclo de vida.

“A cada mudança de endereço, sempre procuramos nos encontrar em um lar, seja lá onde for. Sinto que estou em um lar quando o espaço me faz sentir protegida, acolhida, feliz e em paz. E isso acontece quando estamos cercados de coisas importantes para nós: memórias que vêm de objetos ou móveis; minhas cachorras; amigos e família; natureza, mesmo que manifestada em pequenos vasos. O mais sutil e especial é quando o lar deixa de ser a casa como espaço físico e entra na nossa alma. A partir daí, acredito ser possível levar nosso lar para qualquer lugar e transformá-lo. Como neste trecho do livro Venenos de Deus, Remédios do Diabo, de Mia Couto: ‘Depois de tantos anos, deixamos de viver na casa e passamos a ser a casa onde vivemos’”.

Fotos por Gisele Rampazzo